O USS Bonhomme Richard (LHD-6) sofreu o pior pesadelo de qualquer navio de guerra: Um incêndio de grandes proporções. E para acrescentar insulto à injúria, ele pegou fogo no píer, atracado, e tem pelo menos dois dias que ninguém consegue apagar.
Ele é um navio de assalto anfíbio, mas não foi feito pra participar de arrastões na praia. O Bonhomme Richard é essencialmente um mini-porta-aviões dos fuzileiros navais, capaz de levar uma força expedicionária para qualquer ponto do mundo.
“mini” claro é uma descrição relativa. Ele tem 257 metros de comprimento, é maior que um porta-aviões da Segunda Guerra. Tem o dobro do deslocamento (41000 toneladas) que o PHM Atlântico, o navio equivalente brasileiro, que já é grande bagarai.
Ele pertence à Classe Wasp, são oito embarcações do mesmo tipo. Classe Tarawa os EUA têm cinco navios em atividade, e Classe América, a mais nova, três.
Além do complemento de quase 2000 fuzileiros, ele leva caças Sea Harrier, F-35B de decolagem vertical e helicópteros de ataque.
No dia 12 de julho de 2020, o Richard estava na base naval de San Diego passando por uma manutenção de rotina quando por algum motivo algo explodiu no hangar principal.
Quem já fez reforma sabe a zona que é, panos, latas de tinta, madeiras, jornais, isso tudo lambeu bonito e como provavelmente o sistema de combate a incêndio do navio estava desativado, e o fogo se espalhou.
Pelo menos 15 trabalhadores e 13 marinheiros foram parar no hospital, bombeiros começaram a combater o fogo, mas a situação era sinistra. Helicópteros de combate a incêndio estão sendo usados, junto com rebocadores com canhões de água.
Pesadelo em Alto Mar
Desde o tempo das embarcações de madeira fogo tem sido um terror constante para marinheiros, mesmo estando, ironicamente, cercados de água. Um navio é em essência um monte de compartimentos conectados, criando um caminho ideal para o fogo, e bem difícil para chegar até ele com unidades de combate a incêndio.
Os EUA sabem disso, aprenderam na pele no final dos Anos 60. Primeiro em 1966, com o incêndio no porta-aviões USS Oriskany
.
Um marinheiro estava brincando com um sinalizador de magnésio, o imbecil acendeu o troço, que é basicamente impossível de ser apagado. Para ocultar sua besteira, ele tacou o sinalizador dentro de um armário, que continha outros 250 sinalizadores. O resultado, óbvio, foi um incêndio que se alastrou, matando 44 tripulantes e ferindo 156.
Em 1967, aconteceu de novo.
Em meio à Guerra do Vietnã o porta-aviões USS Forrestal estava em manobras no Golfo de Tonkin, quando um foguete Zuni disparou acidentalmente de um avião no convés. Ele voou por trinta metros, raspou o braço de um tripulante e acertou em cheio o tanque de 1500 litros de combustível na asa de um A4 Skyhawk. Daí a desgraceira foi uma só. Aviões explodiram, bombas explodiram, mísseis explodiram…
No final foram 134 mortos, 181 feridos, e reformas que levaram cinco meses e 602 milhões de dólares em valores de 2019. A Marinha aprendeu várias lições para que um acidente assim jamais acontecesse de novo.
Em 1969, aconteceu mais uma vez.
Dessa vez com o USS Enterprise, e agora a coisa era séria. Se um incêndio em um navio é ruim, um incêndio em um porta-aviões nuclear é pior ainda.
Algum estagiário deixou um carrinho de partida (um equipamento com um gerador e compressor usado pra acionar os motores dos aviões) com o escapamento diretamente apontado pra um lançador de foguetes Zuni preso a um Phantom II. O escapamento aqueceu a ogiva até detonar, explodindo os outros foguetes, tanques de combustível, etc, etc, mesma história de sempre.
O convés foi rompido, combustível em chamas caiu nos decks inferiores, iniciando mais incêndios. Equipamentos anti-fogo foram destruídos pelas explosões, bombas detonaram e todos os procedimentos aprendidos com o acidente do USS Forrestal só funcionaram mais ou menos. Apenas metade dos tripulantes haviam passado por treinamentos anti-incêndio.
O saldo foram 51 dias no estaleiro, 28 mortos, 314 feridos e US$890 milhões de prejuízo, em valores de 2019.
Agora há gente bem-informada dizendo que o USS Bonhomme Richard deu PT. O que significa que só em navio, foi-se embora a bolada de US$750 milhões, fora equipamentos, aviões, etc.
O mais grave é que o acidente demonstra que apesar de todos os avisos e experiências prévias, os EUA ainda estão comicamente despreparados para lidar com acidentes graves em suas embarcações, muito menos preveni-los.
Source link