Apontar o motivo para o Dreamcast não ter dado certo não é uma tarefa muito simples. Fruto de inúmeras decisões equivocadas por parte da Sega, aquele console merecia uma sorte melhor e com o passar dos anos temos descobertos alguns detalhes dos bastidores de uma época em que a empresa japonesa estava à beira do precipício.
Quem resolveu contar um pouco da sua frustração de quando trabalhava com o antigo console foi Mark Subotnick, então produtor na Sega of America. Ao participar da gravação do The Retro Hour Podcast, o game designer explicou o que levou um dos jogos mais promissores para o Dreamcast a ser cancelado.
Batizado como Geist Force, o projeto foi mostrado ao mundo durante a E3 de 1998 e foi visto por muitos como a resposta da Sega ao clássico Star Fox. Sendo o primeiro jogo da divisão norte americana para o console, a ideia seria colocá-lo nas lojas assim que o videogame fosse lançado deste lado do mundo, mas como sabemos, isso nunca aconteceu.
O que se falou na época é que o desenvolvimento havia sido cancelado devido a desentendimentos entre a equipe de desenvolvimento, o não cumprimento de prazos e até o ceticismo em relação a qualidade do jogo. Porém, Subotnick alega que o problema ia além de tudo isso.
Admitindo que o jogo se tratava de um clone do Star Fox, ele garantiu que apesar do título não trazer ideias novas, contava com uma narrativa bacana. O produtor então não hesitou na hora de apontar um responsável direto por o projeto ter sido engavetado.
“[Yuji] Naka veio nos visitar com a sua equipe, para conhecer o nosso estúdio e ver as nossas ferramentas e engine; tínhamos muita tecnologia proprietária e realmente legal — diria que até hoje, [tínhamos] muita coisa que não vi ser replicada no nível do que tínhamos. [Naka] não percebeu que as pessoas na minha equipe, muitas delas falavam japonês fluentemente, incluindo meu engenheiro chefe. [Naka] Começou falando em japonês, presumindo que ninguém entenderia; [ele] começou falando sobre quais partes da nossa tecnologia pegariam para o Sonic e então basicamente disse que assim que eles fossem lançados, que demitissem todo mundo, exceto um engenheiro que conhecia o sistema e o colocasse na nossa equipe do Sonic — e a minha equipe ouviu aquilo, então você pode imaginar como eles se sentiram. O Naka era muito poderoso na Sega naquela época.”
Subotnick então contou que tirando quem fazia parte da Visual Concepts e estava desenvolvendo o NFL2K e o NBA2K, apenas cinco dos seus engenheiros estavam trabalhando em um console de 128 bit nos Estados Unidos. Logo, sabendo da tempestade que estava por vir, o grupo decidiu aproveitar as ofertas de emprego que estavam surgindo e deixou a Sega.
A partir daquele momento o desenvolvimento do Geist Force ficou numa situação terrível. Com uma engine proprietária nas mãos, mas sem pessoas qualificadas para tocar o projeto, o produtor precisou contratar, o que lhe consumiu meses preciosos e como ainda seria preciso treinar aquele pessoal, a criação do jogo estagnou.
O executivo chegou a pedir ajuda ao pessoal da Visual Concepts, único estúdio norte-americano com conhecimento do Dreamcast, mas como eles estavam muito ocupados criando seus próprios jogos, não houve outra opção que não fosse cancelar o desenvolvimento.
Embora uma versão jogável tenha aparecido na internet alguns anos depois, apenas algo entre 65 e 70% do jogo foi concluído e por isso nem dá para chamá-lo de beta. Aquela situação ainda faria com que Mark Subotnick deixasse a Sega of America, com ele passando a trabalhar na Microsoft e tendo ajudado no lançamento tanto do primeiro Xbox quanto do Xbox 360. Hoje o sujeito dirige a área de games criada pela Intel.
Mesmo sabendo que cancelamentos são comuns quando se trata do desenvolvimento de games e que apenas um jogo não seria suficiente para salvar o Dreamcast, é triste ver que algo tão interessante quanto esse “Star Fox da Sega” não viu a luz do dia. Caso o destino tivesse seguido por outro caminho, talvez aquele jogo tivesse dado origem a uma interessante franquia, mas isso é algo que nunca saberemos.
Já em relação a Yuji Naka, eu já declarei meu respeito pelo seu trabalho, com um portfólio repleto de títulos que me divertiram muito, mas é inegável como a sua carreira tem decaído com o passar dos anos. Eu também entendo que no caso do Geist Force ele possa ter tomado uma decisão pensando no bem da empresa, mas ouvindo o relato de Subotnick, como não achar que o japonês tratou a situação de uma maneira muito arrogante?
É aquela velha história de quanto menos soubermos em relação aos profissionais que admirarmos, melhor.
Fonte: VG247
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