Bibliotecários também são heróis – Como eles ajudaram a derrotar Hitler

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Bibliotecários não são o primeiro grupo quando você imagina um cenário de Segunda Guerra, espiões, aventuras na Europa ocupada, mas em verdade eles foram fundamentais para que os aliados vencessem os nazistas. Para entender como, primeiro temos que desmistificar um pouco a imagem da profissão de espião.

James Bond passa a impressão que o dia-a-dia de todo espião evolve visitar cidades exóticas, ficar nos melhores hotéis e viver aventuras mirabolantes, enquanto conhece biblicamente beldades internacionais. Na prática tudo que um espião não quer é chamar atenção.

Bibliotecárias também podem ser heroínas!

E quanto a armas, Tom Clancy dizia que as chances de um agente de inteligência (que é espião, tirando o hype) puxar uma arma e começar um tiroteio era a mesma de criar asas e sair voando.

Claro, existem agentes especializados em ações mais diretas, que o digam Alexei Navalny e Alexander Litvinenko, reza a lenda os búlgaros eram os melhores assassinos, e a própria KGB terceirizava esse tipo de serviço com eles, mas a quantidade de mortes durante a Guerra Fria foi ínfima, ainda mais comparado com o que vemos nos filmes.

Da mesma forma, a maior parte do trabalho de espionagem é coleta de informações públicas. Na Segunda Guerra um sujeito com vista pro Porto de New York com um binóculo conseguia compilar partidas e chegadas de navios, que eram fundamentais para os U-Boats nazistas que os afundariam mais adiante.

Esse inclusive era parte do trabalho dos espiões nazistas no Brasil, usando transmissores clandestinos para avisar o Reich das movimentações de navios aliados.

Um espião compila informações públicas, sente o humor e a moral da população e reporta para a base. Por muito tempo a vida mansa de muitos espiões da KGB nos EUA era compilar notícias do New York Times ou dados de bibliotecas públicas e mandar para Moscou como se fossem dados preciosíssimos.

Na Segunda Guerra, eles eram.

Lembre-se, não havia internet, a televisão ainda estava nascendo e rádio era limitado, para obter informações sobre um país você precisava consumir livros, jornais, relatórios, revistas, e com a guerra ninguém queria mandar essas matérias para o inimigo.

Por causa disso em 1942 o OSS – Office of Strategic Services (Escritório de Serviços Estratégicos), agência governamental dos EUA que antecedeu a SHIELD e a CIA bolou um plano: Se a informação não vinha mais até eles, eles iriam até a informação.

Microfilme era o canal do sucesso.

Foi criado então o IDC, sigla para  Interdepartmental Committee for the Acquisition of Foreign Publications (Comitê Interdepartamental para Aquisição de Publicações Estrangeiras).

Para a missão foram treinados bibliotecários e bibliotecárias, que aprenderam (o mais provavelmente já conheciam) técnicas de microfilmagem, catalogação, identificação de materiais estratégicos, etc.

Esse grupo foi mandado para Lisboa, que à época era uma das cidades mais cosmopolitas da Europa, vivendo uma neutralidade conveniente, repleta de espiões de todos os times, inclusive o famoso Garbo.

Lisboa também tinha a vantagem de ser uma cidade extremamente culta, Portugal como um todo tinha e tem um apreço pela leitura invejável. Hoje há 650 livrarias, em um país de 10 milhões de habitantes. A cidade de São Paulo, com 12.18 milhões de habitantes tem 335 livrarias.

Livraria Lello em Portugal

Diante desse cenário, os bibliotecários americanos fizeram a festa. Bancos de jornal vendiam jornais de quase todas as capitais europeias. Livrarias traziam os últimos títulos publicados nos países do Eixo e seus aliados.

Havia livrarias especializadas em publicações científicas, uma delas era frequentada por aficionados por ferrovias, e trazia e encomendava todos os lançamentos envolvendo técnicas de construção, mapas, catálogos de locomotivas, produção, etc.

Para a maioria dos livreiros os agentes se apresentavam como bibliotecários americanos recolhendo material para a Biblioteca do Congresso, o que nem estava tão distante da verdade.

Como os agentes tinham muito pouco treinamento em espionagem, não falavam português e não sabiam como agir diante da geopolítica do momento, ninguém duvidava que eles fossem um bando de nerds meio perdidos, e acabaram ganhando a simpatia de vários livreiros que não eram exatamente fãs do Terceiro Reich.

Hotel Palácio, em Estoril. Ponto de encontro preferido dos espiões de todas as tribos.

Quando os agentes começaram a se sentir mais à vontade, descobriram que tinham poder de negociação; a ditadura de Salazar impunha uma censura forte e material americano era proibido, mas os agentes do IDC tinham meios para importar via malote diplomático exemplares de revistas americanas como Time, Life e Playboy (ok essa última ainda não tinha sido inventada).

Os livreiros agradecidos revendiam as revistas para seus clientes, alguns deles agentes alemães, e em agradecimento conseguiam os livros e jornais obscuros eu os bibliotecários americanos pediam.

As informações eram valiosíssimas, jornais traziam, no meio de toda a propaganda o resultado de operações aliadas. Às vezes até a coluna social de um jornal local era importante, pois mencionava a presenta de algum General ou Coronel alemão participando de um evento, e com isso era possível identificar aonde a unidade dele estava baseada.

Tudo era microfilmado pelos bibliotecários e enviado para ser analisado nos EUA ou em alguns casos em postos locais. Certa vez, quando os aliados invadiram o Norte da África, o escritório do OSS em Algiers pediu ao IDC que conseguisse jornais alemães atuais, para montarem um panorama de como o inimigo estava tratando a invasão.

O IDC levou quatro dias, mas conseguiu exemplares de dez jornais diferentes, dando aos agentes toda a informação que precisavam.

Em 1946 a CIA apresentou uma proposta ao Congresso pedindo a criação de um comitê permanente, como foi o IDC, dado seu excelente trabalho na obtenção de informações. O documento, que só deixou de ser secreto em 2003, você pode ler aqui (eu amo a Internet).

Durante toda a Guerra Fria o trabalho dos sucessores do IDC só cresceu, com incontáveis livros, revistas, jornais e artigos científicos contrabandeados da União Soviética e seus aliados. Hoje isso está tudo automatizado, a quantidade de informação gerada e compartilhada publicamente é grande demais, mas mesmo os analistas mais experientes não deixam de acompanhar a mídia do “inimigo” para sentir o pulso do país.

Para Saber Mais:

  1. Gathering Enemy Scientific Information in Wartime: The OSS and the Periodical Republication Program
  2. A vida e a morte das livrarias portuguesas
  3. Why the U.S. Sent Librarians Undercover to Gather Intelligence During World War II
  4. spies, lies and double agents: portugal in ww2

 

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