CGi, deepfake e o jabá dos mortos-vivos

[ad_1]

O deepfake vem sendo usado para diversos fins, e hoje é empregado como uma alternativa ao CGi na manipulação digital de rostos, incluindo trazer os mortos de volta à vida. A técnica é usada desde sempre por agências e estúdios para promover produtos ou escalar personalidades falecidas em filmes e séries, mas a evolução da tecnologia criou uma preocupação acerca de como usar a imagem de quem já se foi.

O ator Peter Cushing foi revivido em CGi para Rogue One: Uma História Star Wars (Crédito: Reprodução/Lucasfilm/Disney)

O ator Peter Cushing foi revivido em CGi para Rogue One: Uma História Star Wars (Crédito: Reprodução/Lucasfilm/Disney)

No passado, a revista TIME chamou de “necromancia digital” o ato de trazer de volta atores, cantores e personalidades usando técnicas digitais, mas a verdade é que a propaganda faz isso desde sempre, com sósias e animações. Um filme de época não é tão diferente ao escalar atores como pessoas que existiram, visto que a meta é ter lucro da mesma forma.

Ainda assim, a evolução tecnológica permitiu ir muito além. Ao invés de contar com um ator interpretando uma personalidade falecida, hoje é possível trazer os mortos de volta com boas doses de bruxaria digital. O problema reside em como usar o recurso.

Usar a aparência real de um morto, seu rosto e muitas vezes sua voz, recuperada e reconstruída, para dizer a fazer coisas que o mesmo não faria deveria ser uma preocupação? Quando uma pessoa morre, em tese não há impeditivos para o uso de sua imagem  a menos que o mesmo deixe expresso condições para tal em seu testamento, e muitos deixam. São seus representantes legais, em geral os filhos, os responsáveis por administrar como usar o nome imagem do falecido dali por diante.

A questão é que muitas vezes o dinheiro fala mais alto, o que acaba criando situações esquisitas. Em 2011, a Dior foi uma das primeiras empresas a brincar de necromante, ao reunir Charlize Theron com Marlene Dietrich, Grace Kelly e Marilyn Monroe. O ponto de discussão aqui é a última.

Na época, a peça incomodou por colocar Monroe promovendo um perfume da Dior, quando é fato conhecido que a artista foi garota-propaganda da concorrente Chanel. Mesmo uma década atrás, já havia a preocupação de que a evolução da CGi permitiria recriar personalidades falecidas para promoverem produtos e serviços diversos, alguns até mesmo contradizendo posturas e filosofias que os mesmos tiveram em vida.

O caso da Marilyn foi o primeiro alarme, mas como era tudo perfume, o pessoal deixou passar. Mas o que acontece quando você usa a imagem de um abstêmio convicto para vender álcool? Pois foi o que a Johnnie Walker e a BB8 Studio fizeram em 2013, ao “reviverem” Bruce Lee.

O astro das artes marciais não bebia, mas sua versão digital aparece em um comercial de whisky. A iniciativa pegou muito mal tanto na China e Hong Kong, onde a peça publicitária foi originalmente veiculada, quanto no resto do mundo.

Bruce Lee em CGi (Crédito: Reprodução/BB8 Studio/Diageo) / deepfake

Bruce Lee em CGi (Crédito: Reprodução/BB8 Studio/Diageo)

Em 2014, a fabricante de chocolates Mars veiculou uma propaganda mais amena para sua barra Dove (Galaxy no Reino Unido), usando uma tecnologia de CGi mais refinada que a da BB8 e próxima da empregada na campanha da Dior.

A modelo escolhida foi a atriz Audrey Hepburn, que faleceu em 1993.

No cinema, exemplos como os da Industrial Light & Magic são mais recentes e conhecidos, seja com Grand Moff Tarkin e princesa Leia em Rogue One, ou um jovem Luke Skywalker em The Mandalorian, mas a técnica é bem antiga e usada pelo menos desde Gladiador (2000).

A equipe de Efeitos Visuais teve que recriar o rosto de Oliver Reed para uma cena extra de Próximo, visto que o ator morreu em 1999, durante as filmagens. O recurso aqui foi empregado como necessidade e não conveniência, e você provavelmente só está descobrindo isso agora, de tão bem feito que ficou.

O filme acabou ganhando o Oscar de Efeitos Visuais, apesar de cilindros de nitrogênio aleatórios.

O truque para manter a fidelidade, caso tenha percebido, é fazer com que o personagem fale o mínimo possível, ou não mostrá-lo falando. Os exemplos mais realistas se focam bastante em apresentar a face, mas quando pulamos para a fala, as micro expressões faciais parecem irreais, e quebram a ilusão.

O truque foi bem explorado em Blade Runner 2049, que recriou em CGi o rosto jovem da atriz Sean Young (que está viva e bem, obrigado) para trazer Rachael de volta à vida. Note que quando ela fala, você não vê seu rosto. Este CGi, junto com o de Próximo em Gladiador, foram os dois únicos que me enganaram direitinho.

Sim, outro Oscar de Efeitos Visuais, como adivinhou?

A menos que você esteja vendo Wayne’s World, Spaceballs ou uma novela da Globo, um filme não possui a “hora do jabá” propriamente dita, mas comerciais são outra coisa. Money talks e os boletos são uma das verdades absolutas do universo, mas uma pessoa tem controle e decisão de escolha sobre o que falar, ou ao menos a liberdade de decidir qual campanha vai endossar.

Já morto, a vontade da pessoa passa a ser representada por outros, o que pode gerar conflitos com a personalidade do mesmo enquanto vivo, como nos casos de Marilyn e Bruce Lee. Só que a técnica era cara e hoje está a um deepfake de distância.

O recurso está à beira de ser enquadrado como crime digital no mundo todo, por ser ridiculamente acessível, fácil de usar e essencialmente gratuito, tirando o controle da recriação digital de pessoas das mãos dos grandes estúdios. O deepfake surgiu como uma ferramenta de pr0n falso e foi massivamente usado em ataques de pornografia de vingança, ou em situações onde atores de filmes são trocados por outros, geralmente Nicolas Cage, o que é visto como violação de direitos autorais.

Não demorou para as empresas aproveitarem o deepfake de diversas formas, e uma das mais recentes veio da cervejaria espanhola Cruzcampo, uma das marcas da Heineken. O comercial trouxe de volta a cantora e atriz Lola Flores (1923-1995), falando sobre como ficou conhecida pelo sotaque andaluz. A obra usou centenas de fotos, vídeos e gravações de voz da artista, para compor uma declaração fiel à original.

Claro, é um comercial de cerveja, o que levantou questões sobre se Flores em vida faria ou não tal campanha. O fato dele ter sido autorizado por duas de suas filhas não amenizou as críticas.

Esta é uma polêmica que não terá fim, principalmente porque uma vez que alguém empacota, há um entendimento de que a aparência do morto passa a ser livre, mas se seu uso envolve  lucro, as coisas mudam. Artistas terão que definir a partir de agora como sua imagem será usada depois que morrerem, deixando diretrizes expressas em testamento. Familiares também terão que ficar atentos a isso, sobre se permitem ou não

No caso de Carrie Fisher, a família da atriz e a Disney entraram em um acordo para não usar um CGi, deepfake ou similar de Leia Organa em Star Wars: A Ascensão Skywalker, e o mesmo será feito com Chadwick Boseman, para futuros usos de T’Challa/Pantera Negra nos filmes e séries do MCU. Ao que tudo indica, este será o procedimento padrão da Casa do Mickey para casos similares daqui por diante.

Para todos os demais, vai depender do que familiares decidirem, mesmo que o CGi ou deepfake do artista revivido acabe promovendo algo que ele não faria, quando vivo.

Crédito: The Next Web.

[ad_2]
Source link

× Consulte-nos!