Como a Apple destruiu e absorveu o poder das operadoras

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Nesta segunda-feira (7), a Apple apresentou as novidades das próximas versões de seus sistemas no keynote de abertura da WWDC 2021, e entre elas, um “aceno de mão” para fora da metáfora um tanto manjada do “jardim murado”: o FaceTime vai passar a suportar usuários que não possuem iPhones, iPads ou Macs.

iPhone XR (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

iPhone XR (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Claro, tem uma pegadinha: quem estiver no PC ou em um celular Android só terá acesso a uma chamada de vídeo do FaceTime através de um link, que deve ser compartilhado por um dono de iGadget. O app não será lançado fora do ecossistema da Apple, e quem não tem um iPhone não poderá iniciar uma chamada na plataforma.

Isso ocorre porque da mesma forma que o Mensagens, o aplicativo de videoconferência é usado como pretexto para atrair novos consumidores. Por outro lado, a Apple percebeu que devido a pandemia da COVID-19, o ano de 2020 se tornou um território fértil para apps e serviços similares, em que o Zoom ganhou muito terreno. Outros, como Google Meet, Skype, Discord, Slack, Microsoft Teams e etc, aprimoraram seus recursos para melhor suportar chamadas em grupo com foco corporativo.

Cupertino entendeu que dada a atual situação, o FaceTime não poderia continuar sendo apenas um app de videoconferências focado em conversas familiares, e o turbinou com visualização em grade, áudio espacial, modo para isolar ruídos externos e o ShareTime, que permite compartilhar conteúdos. Tudo para fazer do app um concorrente à altura do Zoom e cia.

Claro, a diferença deste para todos os demais está no controle exercido com mão-de-ferro pela Apple sobre seus produtos, daí a impossibilidade de usuários fora de seu ecossistema iniciarem chamadas no FaceTime, e estes só serem permitidos participar se alguém de dentro do “jardim murado” compartilhar o link.

Embora seja compreensível que a Apple controle seus próprios apps, é importante lembrar que a empresa estende sua visão de “clube exclusivo” também para apps e serviços de terceiros, como condição a serem permitidos entrar na App Store ou Mac App Store. Apps como o Instagram e o Flipboard estiveram entre os mais prestigiados do ecossistema, com destaque em banners e endossos diversos, mas apenas enquanto foram Apple-only.

Quando ambos chegaram ao Android, perderam todo o destaque especial que recebiam. Na época, o VP de marketing Phil Schiller chegou a apagar sua conta no Instagram, porque não queria se misturar à gentalha, que ele chamou de “ruído” em “uma pequena comunidade de entusiastas compartilhando suas fotos”.

Phil Schiller dá suas razões de por que saiu do Instagram (Crédito: Reprodução/9to5Mac)

Phil Schiller dá suas razões de por que saiu do Instagram (Crédito: Reprodução/9to5Mac)

As audiências do processo Apple vs. Epic Games, cujo veredito só deverá sair daqui a alguns meses, trouxe uma série de insights sobre como a maçã opera a App Store, e como é absolutamente contra a ideia de permitir que seus usuários pensem fora da caixa. Desenvolvedores são impedidos de mencionar que é possível adquirir itens sem comprá-los na loja do iPhone, pois isso retiraria os 30% que a Apple cobra sobre microtransações.

Casos isolados existem, como o Spotify. Após anos de brigas e lavação de roupa suja em público, o serviço de streaming de música não conta com a opção de adquirir a assinatura premium dentro do app, tendo o usuário que fazer o processo pela web, algo que a Apple não pode impedir que seja feito. No entanto, ela pode forçar os apps que contam com microtransações a não mencionar a opção.

Foi essa briga que a Epic Games comprou, mas de forma desastrada e contratualmente infratora, ao implementar um sistema de cobrança alternativo no app de Fortnite, que driblava a App Store. A maçã se defende (com razão) que o ato justificou o banimento do game e da Epic Games como um todo de seus sistemas, embora Tim Cook também não tenha escapado ileso.

Durante o depoimento, o CEO da Apple foi grelhado na brasa pela juíza Yvonne Gonzalez Rogers, da Corte Distrital do Norte da Califórnia, onde o caso está sendo analisado. Cook defendeu que empresas não devem ser permitidas a mencionarem formas alternativas de pagamento na App Store, pois isso tiraria o retorno que a maçã considera justo em P&D para estabelecer o iPhone como a maior e mais lucrativa plataforma mobile do mundo.

Rogers devolveu na lata, dizendo que o mercado de games lucra muito mais por conta própria do que o montante revertido pela Apple aos estúdios (ao menos no caso específico de Fortnite), e que os apps e jogos estariam na verdade subsidiando a liderança da Apple no mercado mobile. No entendimento da juíza, a maçã depende mais dos apps do que o contrário.

É importante lembrar que Rogers também não foi nada gentil com Tim Sweeney, CEO da Epic Games, quando este foi ouvido.

Embora a Apple lucre muito com os 30% recolhidos de todos os apps e games com microtransações em suas plataformas, é fato que isso está ligado ao controle rígido que a empresa exerce sobre os desenvolvedores, e por extensão, aos usuários. Ela define como, quando e por quem um produto pode ser usado, o que nos traz de novo ao acesso do FaceTime concedido com restrições para usuários não-Apple.

O comportamento da empresa é muito similar ao que as operadoras móveis praticavam no passado, e ainda tentam fazê-lo no Android, graças à mão frouxa do Google que permitiu a customização do Android por terceiros, incluindo também as OEMs parceiras. Por anos, os celulares vinham atulhados de bloatwares inúteis, ou mesmo tinham recursos capados, que forçavam o dono do aparelho a adquirir serviços pagos.

Claro que o 1º motivo é dinheiro, mas controle também faz parte da equação (Crédito: Divulgação/Epic Games) / apple

Claro que o 1º motivo é dinheiro, mas controle também faz parte da equação (Crédito: Divulgação/Epic Games)

Um dos mais notórios, que foi praticado por muito tempo no Brasil, envolvia o corte no acesso à internet após o fim da franquia pré-paga, quando o certo seria reduzir a velocidade. Operadoras também restringiam o uso de planos móveis para celulares caso detectassem o chip SIM conectado em um laptop ou um tablet, ou se o usuário se atrevesse a compartilhar sua rede com mais dispositivos, por venderem planos específicos em ambos os casos.

A Apple foi parcialmente imune a esses problemas, primeiro por não depender de OEMs para a fabricação do iPhone, e segundo porque Steve Jobs ordenou que o iOS fosse blindado contra bloatwares de operadoras, além de ser atualizável diretamente pela Apple desde o dia 1. Ainda assim, operadoras chegaram a limitar recursos, sendo um dos casos mais notórios o da AT&T, que desligou o FaceTime via Wi-Fi, exigindo que seus usuários adquirissem planos móveis para usá-lo.

A teimosia da Apple em não abaixar a cabeça para as operadoras se refletiu também no Android, com usuários passando a tolerar menos a inclusão de bloatwares. Iniciativas como o Android One (embora sabotada pela Motorola, que cooptou o nome depois de um tempo) ajudaram a fixar neste consumidor que uma experiência limpa, ou quase limpa (como visto nos aparelhos mais recentes da Samsung) é a melhor opção.

Por outro lado, Cupertino aprendeu os macetes que as operadoras usavam para controlar o direcionamento do mercado de celulares, praticado bem antes do iPhone, Android ou mesmo do BlackBerry darem as caras. Ela em mais de um caso pressionou pela inclusão de microtransações em apps, mesmo em serviços que não faziam sentido suportá-las, como o WordPress, apenas para ter algo do qual tirar seus 30%.

Sem contar que o iOS e iPadOS, e em menor grau macOS e tvOS, constantemente promovem ao usuário os produtos e serviços da própria Apple, em detrimento de concorrentes que são parcialmente silenciados, não ganhando destaque algum. De novo, o caso de posicionar o FaceTime como concorrente do Zoom e outros serviços similares de videoconferência, no mundo pós-COVID-19.

Alguns casos são ainda mais flagrantes de como a Apple exerce controle sobre serviços de terceiros. O app para iOS da Ring, divisão da Amazon que vende dispositivos inteligentes para automação doméstica, não conta com a opção de adquirir uma assinatura, mas mesmo no site para o qual ele direciona o usuário, não há um link nem menção de preço. Ao invés disso há um vídeo institucional, onde o interessado descobre como proceder.

Mais ainda, o site móvel ativa um chatbot, que oferece uma série de perguntas que devem ser respondidas, para só então liberar a opção de adquirir a assinatura. Todo esse percurso foi criado, acredita-se, para driblar os sistemas de avaliação automática da Apple, que poderiam seguir o link original incluído no app.

As chances de usuários voltarem a tolerar os abusos de operadoras em celulares hoje em dia é muito baixa, mas é curioso constatar que as mesmas reações não se repetiram com as práticas controladoras da Apple em seus produtos, e claro, o Google também não é inocente nessa história.

A diferença é que o segundo pode ser mais customizado pelo usuário, desde que ele tenha o conhecimento para isso, e de forma legal, o que não ocorre com o iPhone.

Fonte: The Verge



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