A maioria dos exames médicos são invasivos, seja usando os 7 ou 8 (eu contei) orifícios pré-existentes, seja criando novos e dolorosos orifícios, e examinar a oxigenação do sangue arterial costumava significar uma dolorosa punção para colher amostras, até a invenção do oxímetro de pulso.
Como tudo em Ciência, a invenção do oxímetro levou bastante tempo. Envolveu a Alemanha Nazista, Japão e a Força Aérea dos EUA, mas antes de chegarmos lá, vamos à beleza e simplicidade do conceito:
É fato conhecido que sangue oxigenado tem cor diferente do sangue venoso, mais escuro. E não, ele não é azul, é só vermelho mais escuro. Karl Matthes (1905–1962) um médico alemão desenvolveu durante a década de 1930 vários métodos de medição da saturação de oxigênio no sangue, essa pesquisa era estimulada pela Luftwaffe, que havia perdido muitos pilotos para a hipóxia, e precisava entender o funcionamento da falta de oxigenação em grandes altitudes.
Em 1940 Glenn Allan Millikan, nos Estados Unidos começou a pesquisar o conceito, e desenvolveu um oxímetro de orelha, o equipamento dele pressionava o lóbulo, expulsando o sangue e media a oxigenação quando a pressão era eliminada e o sangue voltava para a orelha. O problema era o mesmo, identificar hipóxia em pilotos. Apesar dos avanços o equipamento de Millikan não funcionou muito bem.
Tanto ele quanto Matthes tinham problemas em realizar medições precisas e identificar valores absolutos, mas ele continuou pesquisando e mesmo em 1964 ele ainda estava aperfeiçoando o equipamento, que não era portátil nem barato.
A grande revolução aconteceu em 1972, quando já tínhamos bastante conhecimento da ciência envolvida, e no Japão Takuo Aoyagi e Michio Kishi desenvolveram o chamado oxímetro de pulso. Já havia a tecnologia de LEDs, diodos capazes de emitir luz em frequências bastante específicas.
A técnica desenvolvida por eles usa dois LEDs, um em uma frequência de 660 nanômetros, outro em 940 nanômetros. Uma dessas frequências é absorvida pela hemoglobina oxigenada, outra não é.
Você coloca os leds de um lado do dedo, um detector do outro lado. O detector vai comparar a luz emitida com a luz absorvida. O sangue e os outros tecidos (sim, sangue é considerado um tecido) irão absorver parte dos fótons em ambas as frequências, mas a frequência que não é absorvida pela hemoglobina chegará ao sensor com uma intensidade diferente.
Com isso temos uma base da luz absorvida no geral, e como a proporção de absorção de acordo com a oxigenação é um valor conhecido, é “só” comparar os dois sinais.
O oxímetro ainda faz outros truques, como diferenciar a hemoglobina nas veias e nas artérias. Ele detecta o pulso arterial, e nos intervalos mede o sinal total, que inclui o sangue venoso. Como veias não têm pulsação (quer dizer até tem mas em muito menor intensidade) mais uma vez fica “simples” diferenciar os dois.
A pesquisa de 1972 só foi ser testada em ambiente clínico em, 1975, e a versão comercial do oxímetro de pulso só começou a ser vendida em 1980, e isso revolucionou a medicina. Incontáveis vidas foram salvas por medições rápidas e não-invasivas, pacientes podem ter sua oxigenação monitorada continuamente. Em casos de COVID-19, quando um caso leve pode deteriorar muito rapidamente, uma medição domiciliar pode significar a diferença entre a vida e a morte.
Estima-se que a invenção de Aoyagi sama tenha reduzido em 40 vezes as mortes envolvendo anestesia, e praticamente eliminou a chamada retinopatia da prematuridade, uma condição envolvendo recém-nascidos que pode levar à cegueira.
Por sua contribuição Takuo Aoyagi recebeu a Medalha de Inovação do Institute of Electrical and Electronics Engineers, o primeiro japonês agraciado com o prêmio. Ele também ganhou um doutorado em engenharia da Universidade de Tóquio, e a Medalha de Honra do Governo do Japão, essa ele recebeu do Imperador Akihito em pessoa.
Takuo Aoyagi morreu em 2020, no dia 18 de abril, mas seu invento continua salvando vidas no mundo todo.
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