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Genshin Impact e a evolução dos gacha games

Bastou uma semana para Genshin Impact se tornar o mais novo game sensação de 2020: o RPG de mundo aberto da desenvolvedora chinesa miHoYo registrou 17 milhões de jogadores mobile no período, sem contar PS4 e Windows, e tem lançamento previsto no Nintendo Switch para breve.

Parte de seu sucesso se deve tanto à qualidade técnica em gráficos, som e jogabilidade, quanto ao fato de ser um jogo gratuito com microtransações, o que deixou muita gente preocupada: Genshin Impact é um “gacha game“, nome dado a títulos que visam fazer o jogador gastar dinheiro em itens aleatórios.

miHoYo / Genshin Impact / Divulgação

Crédito: miHoYo / Divulgação

Outrora um método de monetização controverso, com o passar dos anos as desenvolvedoras aprenderam a implementa-lo de modo menos predatório, e em Genshin Impact vemos um sistema que praticamente não exige que o jogador gaste um tostão sequer, a menos que ele seja apressadinho.

O que é um gacha game?

O termo “gacha” é uma corruptela de “gashapon”, aquelas famigeradas máquinas de brinquedos em cápsula que são bastante populares no Japão. Embora similares às máquinas disponíveis nos EUA e até no Brasil, os brinquedos dos gashapon japoneses costumam ser bem mais caros (de US$ 1 a até US$ 5 por jogada) e de maior qualidade.

Esses itens são normalmente parte de coleções e o jogador não sabe o que tirou, o que o estimula a continuar tentando (e gastando) até tirar o que quer, ou completar um conjunto; pense em um Kinder Ovo com brinquedos ultra premium, é o mesmo princípio só que sem o chocolate.

Aniplex / Fate/Grand Order

Crédito: Aniplex

A mecânica dos gashapons começou a aparecer nos jogos digitais no início dos anos 2010, sem muita surpresa no mercado japonês e principalmente em jogos para iOS e Android; alguns dos primeiros “gacha games” usavam um sistema, hoje considerado ilegal no Japão, consistia em combinar um conjunto de itens conseguidos nas tentativas em um mais raro, obviamente sendo alguns mais difíceis de serem conseguidos, o que forçava o jogador a continuar gastando.

Hoje, um gacha game pode ter mecânicas mais ou menos agressivas, mas que não são restritas à raridade dos produtos e sim à necessidade deles, ou não, para o progresso no jogo; outras modificações impostas por legislações na China, Japão e Coreia do Sul também forçam as desenvolvedoras a serem mais generosas e claras.

Hoje, o jogador deve ser informado do “drop rate”, a porcentagem que um item tem para aparecer em um “pull” (a tentativa, que não é nada mais do que girar uma roleta), se um item possui um rate elevado durante um evento, como funciona o “Pity System”, que garante um item raro com 100% de chances após vários “pulls”, e por aí vai.

Algumas desenvolvedoras implementam mecânicas gacha mais agressivas do que outras. A Square Enix, por exemplo, resistiu por anos à implementação do “Pity System” em seus jogos móveis, mas acabou cedendo por pressão dos legisladores japoneses; já como os itens da roleta são implementados varia de um título para outro.

Square Enix / Final Fantasy Brave Exvius

Crédito: Square Enix

Em Final Fantasy Brave Exvius por exemplo, o jogador pode ganhar novos personagens, de diversos níveis de raridade diferentes; já em Dissidia Final Fantasy: Opera Omnia, o jogador precisa fazer “pull” em armas específicas para equipar nos membros de seu time (novos personagens são adicionados no decorrer sa história), que complementam suas habilidades.

Hora de faturar

A roleta de um gacha game consome dinheiro ingame, que pode ser conseguido simplesmente jogando, geralmente de forma limitada; o jogador pode comprar o dinheiro virtual com grana real, mas como o sistema é permanente, ele pode ser frugal ao máximo e acumular suas moedinhas, para quando quisesse tentar a sorte.

É aí que entra o outro aspecto do gacha game: jogos do tipo costumam lançar eventos limitados de forma periódica, estes atrelados a itens novos, raros e que não podem ser conseguidos na roleta normal; esses itens são removidos do jogo ao fim do evento, de modo a fazer com que o jogador gaste seu dinheiro ingame acumulado e, caso não consiga tirar o que quer, abra a carteira.

Aqui a forma de abordar o jogador pode variar, mas são os títulos que oferecem personagens na roleta, como Fate/Grand Order, Arknights e Azur Lane, entre outros, os que fazem uso de designs mais apelativos; ainda assim, mesmo estes podem ser mais ou menos generosos em ceder moedas virtuais ao jogador.

Manjuu / Yongshi / Yostar Games / Azur Lane

Créditos: Manjuu / Yongshi / Yostar Games

O RPG tático Fate/Grand Order, por exemplo, que todos os anos supera Fortnite como o jogo mais comentado no Twitter, é um dos mais regulados nesse sentido, enquanto que o shoot ’em up Azur Lane é um dos mais bonzinhos.

No geral, gacha games oferecem meios de acumular moeda ingame com login e missões diárias, avançando na história, cumprindo certas atividades e etc., principalmente porque os reguladores estão de olho em quem passa do ponto; ainda assim, há certas decisões de design que estimulam o jogador, mesmo que ele não perceba.

A mais clássica é a animação de abertura das loot boxes/invocação/etc., quando o jogador gira a roleta. Aquela sensação de abrir uma caixa sem saber o que tem dentro afeta diretamente o sistema de recompensa cerebral, que produz dopamina ao ter uma experiência satisfatória.

Por isso que as animações são sempre tão atraentes e estimulam a surpresa; mesmo jogos da Nintendo, como Mario Kart Tour e Fire Emblem Heroes, usam o recurso.

Ainda que as caixas de loot sejam um recurso universal (série Call of Duty, Overwatch, Star Wars Battlefront II, etc.), algumas características dos gacha games foram incorporadas em alguns títulos ocidentais, mesmo AAA, como Destiny 2.

Vendo por esse ângulo, é compreensível por que muita gente torceu o nariz para Genshin Impact, mas a verdade é que a miHoYo faz o dever de casa.

Genshin Impact e o gacha amigável

O sistema de gacha de Genshin Impact traz roletas distintas, uma comum e outra premium, cada uma com seu set de personagens e armas que você pode adquirir. O “Pity System” funciona aqui também, que garante um item de raridade alta a cada 10 “pulls”.

A pegadinha é que pode parecer vantagem fazer um pull de 10 toda vez, mas é melhor tentar individualmente e guardar seu dinheiro virtual, apesar do jogo cedê-lo com certa abundância; tanto que mesmo passadas várias horas de jogo, dificilmente você se sentirá compelido a gastar dinheiro real.

miHoYo / Genshin Impact

Crédito: miHoYo

Isso acontece porque a miHoYo preferiu usar a opção de comprar moeda ingame com dinheiro real como uma opção para quem não deseja esperar; mesmo acumular recursos para gastar nas roletas de eventos não é problema, pois Genshin Impact é bem generoso nesse aspecto.

No jogo você usa moedas especiais chamadas Destino Familiar e Destino Entrelaçado para girar as roletas, mas ambas podem ser adquiridas com Gemas Essenciais; para consegui-la, o jogador só precisa jogar normalmente e evoluir, seja cumprindo missões diárias, desvendando novas áreas do mapa, lendo todos os tutoriais, abrindo baús, progredindo na história principal, cumprindo tarefas dadas por NPCs, e por aí vai.

Mesmo o mais Tio Patinhas dos jogadores poderá adquirir itens e personagens raros no sistema de gacha de Genshin Impact, sem gastar seu rico dinheirinho.

miHoYo / Genshin Impact

Crédito: miHoYo

A maneira como a miHoYo lida com suas mecânicas de gacha em Genshin Impact não é apenas fruto da pressão de legisladores da China, que pegam pesado com quem passa do ponto, mas também uma mudança de percepção por parte dos estúdios: vale muito mais a pena cativar com um sistema amigável, do que fazer à moda antiga e tentar esfolar o jogador de todas as maneiras possíveis e imagináveis.

Como já explicado antes, as microtransações podem ser um recurso necessário para monetizar um jogo free-to-play, mas mesmo jogos AAA, de preço cheio e quer também vendem DLCs e expansões, adotam o método.

Ao mesmo tempo, a miHoyo regulou bem seu método para que o jogador dependa apenas de uma experiência comum para conseguir os itens e personagens raros, diferente de outros estúdios que criaram mecânicas cretinas, como aconteceu com Harry Potter: Hogwarts Mystery.

miHoYo / Genshin Impact

Crédto: miHoYo

Se o sucesso de Genshin Impact, que registrou mais de 17 milhões de jogadores mobile na primeira semana (sem contar Windows e PS4), servir como um norte para os estúdios de jogos, é possível que vejamos cada vez mais títulos desenvolvidos com alto orçamento, abarcando todas as características de um AAA e permanecendo gratuitos, com um sistema de microtransações justo e amigável.

No fim, as desenvolvedoras estão aprendendo aos poucos a não irem com sede demais ao pote; neste caso, a carteira do jogador.




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