Mosquitos geneticamente modificados são uma das principais armas contra a Dengue e outras doenças, e vem sendo testados faz tempo, inclusive no Brasil. O que ninguém exceto o Jeff Goldblum esperava era que os mosquitos desobedecessem os cientistas…
O projeto, desenvolvido pela empresa inglesa Oxitec em si é excelente e demonstrou que esse tipo de controle biológico é possível. Ao final do projeto em Jacobina, BA, 92% da população selvagem de mosquitos Aedes aegypti haviam sido eliminados, com ajuda do que a empresa batizou de… Aedes do Bem™.
O projeto, que também foi implantado em Juiz de Fora e Indaiatuba, envolve uma modificação genética do mosquito, alterando o gene OX513A. Essa alteração faz com que os mosquitos geneticamente modificados não consigam se desenvolver além da fase de larva, a não ser que sejam tratados com Tetraciclina, e você já tentou dar comprimido pra mosquito?
Por 27 meses foram liberadas cargas semanais de 450 mil mosquitos machos, com a alteração genética. A idéia é que eles furunfem com as mosquitas, e quando a menor cegonha do mundo trouxer os mosquitinhos, eles morrerão ainda na tenra idade, virgens e puros, sem deixar descendentes.
Como o gene não é passado adiante, e mosquitos machos sem o tal gene continuam por aí. Com o tempo a população modificada desaparece, e o número de mosquitos volta ao normal.
Em testes em Juazeiro a população voltou a crescer depois de 17 semanas da última liberação, em Jacobina o efeito durou por 32 semanas1.
Os cientistas notaram que os mosquitos geneticamente modificados estavam sendo rejeitados pelos fêmeas, o que aumentava a população viável, mas também descobriram outra coisa: Mosquitos com o gene estavam se reproduzindo e gerando prole viável. O tal gene começou a aparecer entre a população nativa, não só entre os diretamente afetados pelo projeto.
Segundo um artigo publicado na Nature em 10 de Setembro de 2019, algo inesperado aconteceu. Entre 10% e 60% dos mosquitos vivos serelepes da região possuem o gene OX513A.
Em laboratório 3% das proles produzidas eram viáveis, mas os cientistas achavam que eles eram fracos demais para se reproduzir, tipo quando a patroa fica cutucando a gente domingo de manhã depois do churrascão de sábado, querendo coelhar.
O problema é que assim como Informática, Biologia não é uma ciência exata. Genes não são operadores booleanos, não funcionam como 0 ou 1. A expressão de um gene depende de N fatores além de sua existência, em cada célula ele vai funcionar de forma diferente, e sua simples presença não é garantida em todas elas. Por isso você tem pessoas com uma imensa variedade de tons de pele, cor de cabelo e resistência a lactose.
O mosquito geneticamente modificado com baixa expressão do gene conseguiram jogar um caô para as mosquitas, dizendo “eu não sou como aqueles outros caras”, e créu, passou seus genes adiantes. Os filhotes sobreviveram, e como a alteração atenuada não era mais 100% mortal, alguns sobreviveram. Outra geração, os sobreviventes se reproduzem, e o ciclo continua. Temos agora 60% da população natural portando o tal gene, não sendo afetados se houver uma nova introdução de mosquitos modificados na região.
Segundo a pesquisa divulgada2, não há nenhum efeito do tal gene na carga viral dos mosquitos, eles não estão mais poderosos, infecciosos ou resistentes. É um risco da engenharia genética, e por causa disso muita gente tem medo de organismos geneticamente modificados. Eu ficaria com medo também se não soubesse que todo dia bilhões de mutações aleatórias ocorrem pelo mundo, e não temos nenhum controle sobre isso. Se preocupar com engenharia genética é mais ou menos como ter medo de engasgar com um copo d´água no bar do Titanic.
Os cientistas esqueceram de um conceito básico: A Vida sempre acha um caminho, o imperativo reprodutivo é forte demais, o DNA, assim como a especiaria precisa fluir. Se houver a menor brecha, ela vai ser explorada.
Mosquitos geneticamente modificados modificados
A Oxitec cancelou a produção de novas unidades do mosquito OX513A, agora vão produzir uma versão nova, onde a alteração genética mata especificamente as fêmeas, eles esperam que dessa vez os genes não sejam repassados para as futuras gerações, e a perda de eficiência seja menor ou desapareça. A eles, 4,5 bilhões de anos de evolução dizem “vai na fé, irmão”.
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