Os “tokens não-fugíveis” (ou “NFT”, na sigla popularizada em inglês) são ativos digitais colecionáveis que utilizam da tecnologia oferecida pelas blockchains, também utilizada em criptomoedas, para se tornarem únicos. Apesar de ter sido proposto ainda em 2014, o formato somente despontou nos últimos meses, quando foi incorporado em sites de leilões com lances aceitos em criptomoedas — como o OpenSea e o Rarible.
Os arrematantes recebem não apenas a arte digital, mas também um código vinculado ao item, que pode ser verificado via blockchain para mostrar qual é o original. Assim, um arquivo de imagem em NFT, por exemplo, pode ser baixado, copiado e compartilhado diversas vezes na internet por qualquer pessoa, mas ainda será possível verificar qual foi a primeira edição da obra, garantindo a possibilidade de valorização.
Além disso, o acordo também acompanha um contrato de cessão de posse, que é inteligente e bastante personalizável. Assim, a compra pode garantir o direito total de uso para o novo dono ou até mesmo tomar uma pequena comissão para o autor, caso a peça seja revendida no futuro.
Assim como no meio tradicional, as NFTs podem ter diferentes estilos estéticos. (Fonte: Jose Deblo (à esquerda), Mike Parisella (à direita) / Reprodução)Fonte: Jose Deblo, Mike Parisella
Embora as possibilidades para a tecnologia sejam vastas, a maioria dos leilões oferece obras de artes digitais, que por vezes recebem lances exorbitantes, capazes de chocar a maior parte dos internautas. Sem surpresas, o fértil nicho rapidamente se tornou palco de coleções bem sucedidas de imagens, abrigou golpes e recebeu a entrada de grandes empresas — fatores que não apenas contribuíram com a popularização do formato, como também garantiram uma reputação infame para seus apoiadores.
NFT: as garantias legais e o futuro
Impulsionada pelo ceticismo e outras críticas à tecnologia, como sua suposta alta demanda energética e a legalidade dos fundos investidos, parte dos internautas adotou uma postura satírica ao nicho dos NFTs, incentivando sua “cópia” como protesto ao seu uso e negociação. Mas afinal, é possível encarar consequências legais por atitudes como essa?
A resposta, bastante simples, resume-se em um: “não, mas depende”. Até o momento, ainda não há registros de processos legais por “furto de um NFT”, contudo, o cenário jurídico pode encarar uma rápida adaptação e entender os ativos únicos como uma commodity. No entanto, como o comércio atual de NFTs está ligado aos códigos de validação, e não com a obra em si, não existem implicações de direitos autorais que abririam brechas para processos.
Segundo explica o TechCrunch, a menos que o artista e o comprador do NFT realizem um acordo mais amplo, o comprador do token não possui direitos autorais sobre a obra e é dono apenas da ferramenta de validação de originalidade do item. Ou seja, se você está copiando imagens de macacos estilizados no Twitter e não está fazendo uso comercial dos arquivos, não é necessário acionar advogados.
Apesar disso, a linha legislativa da tecnologia deve ficar cada vez mais cinza, já que grandes empresas estão embarcando nessa onda. A mudança já tomou início em alguns estados norte-americanos, encontrando impulso na entrada de empresas e grandes nomes da indústria cultural no nicho, como a própria Marvel, e celebridades como o integrante da banda Linkin Park, Mike Shinoda.
Coleção de NFTs da NBA oferece vídeos das melhores jogadas em um formato de cartas colecionáveis. (Fonte: itsBlockchain / Reprodução)Fonte: itsBlockchain
Otimista com a tecnologia, o experiente economista e Diretor Executivo da Arthur Mining, Ray Nasser, explicou ao TecMundo sua perspectiva para o futuro legal das NFTs: “Os registros simplesmente terão validade judicial,” ele pondera, “[A] Blockchain é de longe superior a qualquer cartório, uma vez que os registros são imutáveis e permanentes. Uma vez descentralizados dos cartórios e afins o processo de realizar registros, estaremos prontos para dar ao povo uma opção mais barata e eficiente de registrar propriedade — sendo ela física ou virtual,” conclui.
Bem ou mal, fale de mim
Todavia, a discussão sobre a possibilidade de um processo desse tipo parece se limitar aos críticos da tecnologia, já que boa parte dos detentores de NFTs entendem que a difusão não solicitada de suas imagens acaba funcionando como um mecanismo natural de especulação. Essa interpretação é devida ao conceito-chave das peças, que possuem a prerrogativa da autenticidade garantida pela blockchain — ou seja, assegurando que haja apenas uma variante original.
Por outro lado, alguns internautas mais céticos definem esse mesmo fator como depreciativo ao valor dos ativos, já que qualquer usuário poderia obter uma cópia “inteiramente funcional” de uma NFT sem muita dificuldade. A discussão pode encontrar paralelos com os diversos nichos de colecionadores tradicionais, que costumam desembolsar grandes quantias para garantir a posse de um artigo autêntico, embora as alternativas “xerocadas” sejam mais baratas.
Estátua digital de Raf Grasseti, diretor de arte de God of War (2018), vendida como NFT por US$ 137,5 mil. (Fonte: Raf Grassetti / Reprodução)Fonte: Raf Grassetti
O cofundador da Wise&Trust e autor do best-seller “O futuro do dinheiro”, Rudá Pellini, compartilhou sua perspectiva sobre o caso em uma entrevista ao TecMundo: “Na prática, cada NFT é um item único digital. É como a Monalisa, você pode ter uma cópia, mas só existe uma original. A diferença é que um NFT é digitalmente programado, registrado através de código computacional,” ele contextualiza.
Quanto ao caráter legal da tecnologia, o especialista avalia que processar usuários da internet por replicar imagens ligadas aos tokens não fungíveis não faz sentido. “O que mais faz sentido, e o que tem acontecido: a cópia gera popularidade desses tokens, consequentemente os valorizando como ativos escassos,” conclui.
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