Para quem se lembra das aulas de geografia na escola, a Terra é dividida em camadas: a mais externa é a atmosfera, seguida de crosta, manto, núcleo externo e núcleo interno. Pesquisadores da Universidade Nacional da Austrália (ANU) anunciaram agora que essa estrutura vai precisar ser corrigida, frente aos indícios de que, no interior do planeta, haveria um terceiro núcleo.
“Encontramos evidências que podem indicar uma mudança na estrutura do ferro no interior da Terra, o que sugere talvez dois eventos separados de resfriamento na história do planeta”, disse autora principal do estudo, a sismóloga e geofísica matemática Joanne Stephenson.
Em 2015, uma equipe de pesquisadores das universidade de Illinois (EUA) e Nanjing (China) analisou ecos de terremotos e descobriu que os cristais de ferro do centro e os da parte externa do núcleo interno têm estruturas muito diferentes: enquanto os do interior (ocupando cerca de metade do diâmetro da estrutura) apontam na direção leste-oeste, aqueles no limite com o núcleo externo estavam alinhados norte-sul.
Não apenas o arranjo geológico é diferente: o comportamento das duas partes que compõem o núcleo interno também não é igual – o que os pesquisadores consideraram uma evidência de que o material também não é o mesmo.
Mudanças drásticas
“O fato de termos duas regiões distintas pode nos dizer algo sobre como o núcleo interno está evoluindo. Ao longo da história da Terra, ele pode ter sofrido mudanças drásticas ao se formar, e esse processo seria a chave de como o planeta evoluiu”, disse à época, em comunicado, um dos autores do estudo, o geólogo Xiaodong Song.
A mudança durante a formação do núcleo terrestre, há 4,6 milhões de anos, foi um período turbulento e que deixou marcas profundas no interior do planeta, conforme revelou o estudo de 2015.
“Os pesquisadores notaram diferenças na forma como as ondas sísmicas viajam pelas partes externas do núcleo interno e seu interior, mas nunca antes fora sugerido que o alinhamento do ferro cristalino que compõe esta região é completamente torto, em comparação com as partes externas”, disse o geólogo Simon Redfern, da Universidade de Cambridge, em entrevista à BBC News.
Para o cientista, que não participou do estudo, “se isso for verdade, implicaria que algo muito substancial aconteceu para inverter a orientação do núcleo, modificando o alinhamento dos cristais de ferro para o sentido norte-sul”. Ele acrescentou que o estudo é fundamental para entender o que acontecerá com o planeta em bilhões de anos, já que o núcleo da Terra está crescendo a uma taxa de 0,05 mm ao ano.
Terremotos e IA
O próximo passo foi conseguir evidências da diferenciação do núcleo interno pelos cientistas da ANU, envolvidos em uma pesquisa que trata especificamente do interior da Terra. Em 2018, o grupo voltou às ondas sísmicas e comprovou que o núcleo terrestre é sólido e, ao mesmo tempo, mais macio do que se imaginava, o que significa que ele pode se deformar mais facilmente.
O eco de ondas sísmicas tem sido usado para investigar o núcleo da Terra.Fonte: Indiana University Bloomington/Reprodução
Ecos de terremotos também foram empregados na pesquisa de Stephenson, com uma ajuda a mais: “A ideia de outra camada distinta foi proposta há décadas, mas todas as pesquisas em relação a isso sempre retornaram dados não eram muito claros. Conseguimos contornar isso usando um algoritmo de busca muito inteligente, treinado para vasculhar milhares de modelos do núcleo interno”, disse ela.
Apesar das evidências, ainda não se sabe o que causou essa separação nas entranhas do planeta. “Os detalhes deste grande evento ainda são um pouco misteriosos, mas adicionamos outra peça do quebra-cabeça quando se trata de nosso conhecimento do núcleo interno da Terra.”
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