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O Jovem™ quer matar o telefone, e isso é ótimo

Antigamente a única coisa pior que telefone era telegrama. Todo mundo morria de medo de receber telegrama. Ou era cobrança ou era morte. Às vezes era alguém que morreu e tinha te deixado as vítimas. Telefone, idem. Telefone tocando depois das dez da noite? Morte na certa.

Uma jovem. (Crédito: Jan Vašek via Pixabay)

Por décadas telefones serviam apenas pra falar (Os da TELERJ nem isso, como lembra a clássica crônica de Arnaldo Jabor Maldita seja a companhia telefônica do Rio) e nós respondíamos de forma pavloviana a seus toques.

Quando os celulares surgiram, também eram usados apenas para falar, pelo pouco tempo de conversação permitido pelas baterias da época, ao menos. O SMS foi a primeira tentativa de nos libertar da ditadura da voz.

Com os smartphones rodando Symbian e Windows Mobile, era possível usar ICQ e MSN, mas a grande maioria dos celulares, mesmo no início da fase smart ainda eram vistos como mais telefones do que qualquer coisa, e uma de suas grandes vantagens era podermos escolher… ringtones.

Sony-Eircsson T610, circa 2003/2004. Era um telefone horrendo, morreu numa noite de reveillon arremessado contra uma parede. (Crédito: Arquivo pessoal)

Nerds mais safos desenvolviam e desencavavam todo tipo de programa para converter arquivos MIDI em ringtones, assim que os celulares se tornaram um tiquinho mais potentes, ringtones em formato WAV foram possíveis, então todo mundo tinha o tema de Missão Impossível tocando.

O pessoal menos salvo comprava ringtones, através de lojas primitivas das operadoras. Nessa brincadeira em 2004 aquela abominação do Crazy Frog faturou £40 milhões.

O que ninguém previu é que os celulares se tornariam muito mais dispositivos de comunicação de uso geral do que… telefones. Até hoje defendo que um iPod Touch, que era um iPhone só com WIFI seria o celular perfeito se tivesse o sinal de dados da operadora, sem um número de celular ou canal de voz atrelado.

Hoje em dia nunca se usou tanto telefone celular e nunca se falou tão pouco ao telefone. Uma pesquisa descobriu que o Jovem entre 16 e 24 usa o celular para tudo, menos para falar. A quantidade de opções é imensa, entre instant messengers, canais de redes sociais e email. Não, mentira, o Jovem™ acha que email e Facebook são coisas de velho. Estão certos.

Imagem meramente ilustrativa (Crédito: Anastasia Gepp via Pixabay)

Não faz mais sentido um ringtone intrusivo interrompendo o que você está fazendo. O Jovem prefere uma notificação discreta na tela, para a qual ele provavelmente está olhando, ou enviada para uma pulseira tipo Fitbit ou MiBand, ou um Apple Watch.

Por causa disso esse jovem está colocando o celular no mute. E com celular silencioso, ninguém liga pra ringtones. A mesma pesquisa descobriu que entre 2016 e 2020 o número de ringtones baixados no Reino Unido caiu de já insignificantes 4.6 milhões para 3.7 milhões, e eu tenho plena convicção de que a imensa maioria desses downloads foi feito por velhos, não jovens.

No Brasil, onde o Whatsapp ainda é extremamente popular, a ligação de voz foi substituída pela ligação de voz assíncrona, com pessoas mandando mensagens de voz que podem ser perfeitamente substituídas por três ou quatro palavras digitadas, mas brasileiro tem horror a escrever. Com isso ringtones ainda conseguiram uma sobrevida, mas em sua grande maioria se resumem aos modelos oferecidos por padrão pelos aplicativos.

Se a tendência prosseguir, um dia fazer uma ligação de voz sem avisar e combinar antes será considerado tão abominável e socialmente execrável como aparecer para visitar alguém sem avisar, e acreditem, antigamente isso era bem comum.

Quanto a mim continuo odiando ligações de voz, e para tornar mais evidente ainda, meu ringtone é o mesmo de Sterlin Archer.


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