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O que realmente se sabe sobre o suposto Planeta 9?

*Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.

Muitos de nós, ao menos aqueles com mais de 20 anos, conseguimos nos lembrar da época em que o Sistema Solar possuía nove planetas. Aprendíamos na escola sua posição relativa ao Sol em ordem de distância, Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno, Plutão e que este último era o menor de todos eles. Há 15 anos, porém, Plutão não faz mais parte da categoria de planetas, tendo passado a integrar a classe distinta de planeta-anão. Além disso, embora a organização planetária tenha mudado, a família cósmica do Sistema Solar cresceu significativamente desde então, com a descoberta de diversos novos asteroides e de outros planetas-anões.

Apesar de todos os avanços que ocorreram na compreensão da nossa estrela e dos corpos celestes que ela orbitam, uma peça desse quebra-cabeça ainda permanece perdida em nosso quintal: um suposto novo planeta, conhecido como Planeta 9, pode estar nas periferias do Sistema Solar, esperando para ser detectado. Mas, vamos retroceder um pouco no tempo e contar essa história por partes!

Concepção artística do hipotético Planeta NoveConcepção artística do hipotético Planeta NoveFonte:  Caltech/R. Hurt (IPAC) 

Há exatos 240 anos, em 1781, o astrônomo William Herschel anunciava à Royal Society a descoberta de um corpo celeste que ele julgou ser uma “estrela nebulosa” ou uma espécie de cometa. Tratava-se, na verdade, de Urano, um dos planetas principais do nosso sistema. Logo após essa descoberta, o novo planeta passou a ser observado e estudado sistematicamente. Sua órbita ao redor do Sol, por exemplo, passou a ser estabelecida de forma precisa a partir de numerosas observações feitas por diversos astrônomos ao redor da Europa. A órbita observada, contudo, não estava inteiramente de acordo com aquilo que se esperava das deduções obtidas a partir da gravitação newtoniana dos corpos celestes. A posição de Urano não coincidia com os resultados dos cálculos, estando sempre ligeiramente atrasado ou ligeiramente adiantado em relação a posição prevista pela teoria. Esse problema, contudo, não perdurou indefinidamente e logo foi sugerido que a discrepância na sua órbita era devida à presença de um outro planeta massivo além de Urano e que estaria perturbando gravitacionalmente o seu movimento. De fato, com anos de cuidadosas medições das variações da posição de Urano e previsões matemáticas, foi possível estimar a posição do planeta desconhecido e procurá-lo no céu. Em 1846, o então novo planeta, Netuno, foi descoberto.

Urano, o sétimo planeta do Sistema SolarUrano, o sétimo planeta do Sistema SolarFonte:  Voyager 2/NASA 

Para além da órbita de Netuno, existem uma infinidade de pequenos corpos congelados que orbitam o Sol a distâncias grandiosíssimas! Esses objetos, aos quais estão inclusos Plutão e outros planetas-anões, são chamados de objetos transnetunianos e também são constantemente observados e estudados pelos astrônomos. Nas últimas décadas, os catálogos de objetos transnetunianos cresceram exponencialmente, passando de um punhado de objetos conhecidos para uma miríade deles. Contudo, assim como ocorreu com Urano, os astrônomos perceberam que alguns desses objetos possuem órbitas excepcionais. Alguns deles possuem órbitas com inclinações muito altas, outras são demasiadamente alongadas, com os eixos maior e menor de suas órbitas elípticas com uma enorme discrepância… alguns deles têm, inclusive, uma combinação de parâmetros que os colocam muito além do que se esperaria para uma órbita comum. A grande questão que se formou, então, foi: por quê?

Representação artística dos objetos transnetunianosRepresentação artística dos objetos transnetunianosFonte:  Johns Hopkins University 

Uma das principais hipóteses é que esses objetos são perturbados gravitacionalmente por outro planeta massivo e ainda mais distante: o Planeta 9. Cerca de 5 anos atrás, dois astrônomos da Caltech, Konstantin Batygin e Michael Brown, ao estudarem as propriedades de agrupamento de um grupo desses objetos transnetunianos com órbitas incomuns, descobriram que eles não estão distribuídos aleatoriamente, mas podem estar movimentando-se de maneira peculiar devido à existência de um planeta enorme que reside muito mais distante que a borda exterior do cinturão de Kuiper.

As órbitas dos objetos transnetunianos estudados por Batygin e Brown, junto com a órbita proposta para o Planeta Nove (em vermelho)As órbitas dos objetos transnetunianos estudados por Batygin e Brown, junto com a órbita proposta para o Planeta Nove (em vermelho)Fonte:  Batygin & Brown 

O Planeta 9 pode estar até 400 vezes mais distante do Sol do que a Terra e pode ser cerca de 15 vezes maior do que o nosso planeta. Isso o colocaria numa posição média entre os tamanhos da Terra e Netuno, característica diferente de qualquer outro planeta em nosso Sistema Solar. Konstantin Batygin e Michael Brown sugeriram que o planeta nove poderia ser o núcleo de um planeta gigante que foi ejetado de sua órbita original por Júpiter durante os primórdios do Sistema Solar, quando nossa estrela e os planetas ainda estavam nos estágios iniciais de formação. Outros cientistas propuseram que o planeta foi capturado de outra estrela, tendo sua origem interestelar, ou ainda que o planeta tenha se formado em uma órbita distante e foi puxado para uma órbita excêntrica por uma turbulência gravitacional de uma outra estrela.

Comparação do tamanho da Terra com o exoplaneta 55 Cancri, que teria aproximadamente o mesmo tamanho do Planeta NoveComparação do tamanho da Terra com o exoplaneta 55 Cancri, que teria aproximadamente o mesmo tamanho do Planeta NoveFonte:  NASA/JPL-CALTECH/R. HURT (SSC) 

Até a presente data nenhuma observação do hipotético Planeta 9 foi realizada. Isso não significa, entretanto, que ele não exista. Com sorte, em breve, com o advento de novos telescópios terrestres e espaciais a caminho (especialmente o Observatório Vera Rubin, previsto para entrar em operação ano que vem, no Chile), o Planeta 9 será detectado ou será descartado por completo como hipótese possível.

Seja como for, se ele existe ou não, continuaremos a estudar e a buscar entender o Sistema Solar, nosso primeiro endereço cósmico, desde a vizinhança mais próxima aos seus confins mais extremos.

Nícolas Oliveira, colunista do Tecmundo, é licenciado em Física e mestre em Astrofísica. É professor e atualmente faz doutorado no Observatório Nacional, trabalhando com aglomerados de galáxias. Tem experiência com Ensino de Física e Astronomia e com pesquisa em Astrofísica Extragaláctica e Cosmologia. Atua como divulgador e comunicador científico, buscando a popularização e a democratização da ciência.


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