*Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Em 2019, o Brasil perdeu a certificação de “país livre do sarampo” após uma retomada na circulação do vírus (os últimos casos dessa doença tinham ocorrido em 2015). O ressurgimento de uma doença que estava controlada demonstra consequências do relaxamento da população e do governo em trabalhar na conscientização contínua com relação às vacinas.
Não pode ser aceitável que, em pleno 2020, qualquer pessoa perca a vida por conta do sarampo. No ano passado, 10 pessoas morreram em decorrência da doença. Esse caso específico é apenas um exemplo do que não fazer ao cuidar de uma doença viral que foi controlada por vacina. É importantíssimo nos mantermos alertas para que, uma vez controlada (ainda não é o caso), não ocorra o mesmo com a covid-19.
Com a pandemia, um dos assuntos mais discutidos foi a liberdade. Seja a liberdade de decisão para tomar vacinas, liberdade de ir e vir quando estivemos na quarentena, ou de expressão para proliferar notícias falsas e desinformação. Pode parecer óbvio, mas é preciso dizer que a liberdade individual termina (ou deveria) quando esbarra na liberdade coletiva, ainda mais quando tratamos de uma questão de saúde pública.
A hesitação da população sobre vacinas existe desde que surgiu a primeira vacina e, por esse motivo, é papel de governantes e da comunidade científica informar e verdadeiramente educar, para que as pessoas não precisem somente aceitar as informações ou que se dependa de uma “confiança cega” na Ciência.
É preciso sempre evidenciar que o motivo pelo qual depositamos nossa confiança na Ciência é o fato desse conhecimento ser fruto de um processo em que toda alegação (seja de cientistas ou de autoridades) é duramente analisada por toda uma comunidade, o que tende a evitar achismos e/ou concepções prévias. Além do histórico de acerto nas previsões científicas em diversas áreas.
Entretanto, o desafio de manter a população consciente sobre a importância das vacinas vem sendo potencializado pelas redes sociais onde é bastante difícil separar informação de desinformação.
No caso das vacinas, os líderes do movimento antivacina viram desde o começo da pandemia (março de 2020) uma oportunidade de “educar” as pessoas, segundo mostra um ensaio publicado em 31 de agosto de 2021 no jornal americano The New York Times. Entenda aqui “educar” por “espalhar a desinformação sobre as vacinas”. Nos Estados Unidos, 9% das pessoas não consideravam as vacinas seguras em 2015, já em 2021, o número de indivíduos que se declara abertamente como antivacina já é de 22%.
A comunidade científica vem investigando a forma e os motivos pelos quais o movimento antivacina, assim como outros movimentos anticientíficos, tem ganhado tanta força nos últimos anos. Declarar-se abertamente contrário à vacinação é uma prática incomum até para os sites e páginas que servem de “referência” para esse movimento e que, costumeiramente, declaram-se “a favor de uma vacinação segura”, “a favor da escolha” ou coisas do tipo.
Esse tipo de discurso foi analisado em um estudo publicado em março de 2021 sobre os motivos comportamentais que levam pessoas a acreditar em discursos negacionistas. Os pesquisadores Federico Germani e Nikola Biller-Andorno argumentam que os indivíduos contrários à vacinação se engajam mais em teorias da conspiração, como por exemplo a de que supostas “elites que querem conquistar o mundo” ou no chamado “controle populacional”.
Além disso, argumentos emocionais que relacionam as teorias da conspiração com figuras públicas sobre as quais as pessoas já têm opiniões prévias, ou com palavras como “Deus” e “família” tendem a engajar mais as pessoas contrárias à vacinação nas redes sociais.
Essa observação é de grande importância para a comunidade científica e para todos que pretendem comunicar Ciência ou argumentar contra teorias anticientíficas. No debate do emocional contra o racional, os argumentos emocionais costumam ter um poder persuasivo maior.
Relatos contados em primeira pessoa sobre um caso específico de alguém conhecido são mais interessantes, envolventes e, muitas vezes, de mais fácil entendimento, do que estatísticas complexas que, por mais corretas que estejam, demonstram um argumento lógico. Porém, para não cair em falsas analogias, a maneira de utilizar os ditos argumentos emocionais a favor da comunicação da Ciência deve ser, mais do que nunca, extremamente racional.
Rodolfo Lima Barros Souza, professor de Física e colunista do TecMundo. É licenciado em Física e mestre em Ensino de Ciências e Matemática pela Unicamp na área de Percepção Pública da Ciência. Está presente nas redes sociais como @rodolfo.sou
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