O que aconteceu nos três primeiros minutos do Universo?

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*Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.

A história da origem do Universo foi contada por diversos mitos e religiões ao longo da existência humana. Contos, ideias e crenças das mais variadas buscaram e ainda buscam explicar o porquê da Terra, dos céus e de tudo o que há neles terem passado a existir. Há pelo menos 100 anos, a ciência também tem buscado contar essa história, investigando as estruturas mais distantes do universo, as galáxias e estrelas mais antigas que existem e a radiação mais velha que se consegue detectar.

O ramo da astronomia que se destina a essa investigação chama-se cosmologia: o estudo da origem e evolução do universo como um todo. Essa ciência busca responder alguns dos questionamentos filosóficos mais profundos e antigos da história: de onde viemos? Para onde vamos? Quão grande é o Universo? Como ele se comporta? Bom, a cosmologia busca responder essas e outras perguntas ao menos pela perspectiva científica.

Através das respostas que ela encontrou até então, é possível vislumbrar algumas peças montadas deste quebra-cabeça cósmico. Sabemos, por exemplo, que o universo possivelmente teve início em algum momento há cerca de 13,8 bilhões de anos através de um evento de proporções inimagináveis. Esse evento foi marcado por uma grande explosão conhecida pela expressão familiar Big Bang (grande explosão). Entretanto, essa não foi uma explosão como aquelas que conhecemos na Terra, com um grande estampido e que começa no centro de um objeto definido até se espalhar mais e mais para o ambiente ao redor. Não. Essa foi uma explosão que ocorreu simultaneamente em todos os lugares, preenchendo todo o espaço desde o início, com cada partícula de matéria separando-se mutuamente de todas as outras partículas.

Ilustração mostra trajetória desde o Big Bang (à esquerda) até os tempos atuaisIlustração mostra trajetória desde o Big Bang (à esquerda) até os tempos atuaisFonte:  Andrea Danti/Shutterstock 

Sabemos também que as primeiras estrelas se formaram possivelmente nos primeiros 200 milhões de anos do universo e que as primeiras galáxias se formaram quando o Cosmos tinha cerca de 400 milhões de anos. A partir do colapso gravitacional da matéria, estruturas cada vez maiores foram sendo formadas, até chegar nos grandiosos aglomerados de galáxias, as maiores estruturas que existem. Nesse palco, a Via Láctea, se formou em algum ponto aproximadamente 13 bilhões de anos atrás e nosso sistema solar há cerca de 4,6 bilhões de anos.

GN-z11, a galáxia mais velha já descoberta, formada quando o Universo tinha cerca de 400 milhões de anosGN-z11, a galáxia mais velha já descoberta, formada quando o Universo tinha cerca de 400 milhões de anosFonte:  NASA, ESA, P. Oesch (Yale University), G. Brammer (STScI), P. van Dokkum (Yale University), and G. Illingworth (University of California, Santa Cruz) 

Mas o que aconteceu nos primeiros minutos do Universo? Como é possível saber qualquer coisa sobre os primeiros instantes da existência de tudo? Por incrível que pareça, uma teoria acerca do universo primordial tornou-se tão amplamente aceita entre os astrônomos que costumam chamá-lo de “modelo padrão” e é um pouco disso que tentaremos compreender agora de forma simplificada.

Quando o universo tinha por volta de um centésimo de segundo (o primeiro intervalo de tempo com o qual se pode falar com alguma segurança), sua temperatura era de cerca de cem bilhões de graus Celsius. Essa temperatura, muito mais alta que o núcleo de qualquer estrela, impossibilitava que algumas das componentes da matéria comum, como moléculas ou átomos, se mantivessem unidas. Nesse momento, havia apenas vários tipos das chamadas partículas elementares.

Esquema representativo da formação das primeiras partículasEsquema representativo da formação das primeiras partículasFonte:  School Science 

Exemplos dos tipos de partículas elementares presentes em grande quantidade são os elétrons e os pósitrons (uma partícula carregada positivamente com a mesma massa do elétron). Além desses, havia neutrinos, fótons que também estavam sendo continuamente criados e aniquilados a partir da energia. Havia também pequenas quantidades de partículas mais pesadas, como os prótons e os nêutrons, que constituem os núcleos atômicos.

Conforme o Universo se expandia, a temperatura caiu, atingindo cerca de três bilhões de graus Celsius após aproximadamente quatorze segundos. Essa temperatura foi baixa o suficiente para que elétrons e pósitrons se aniquilassem mais rapidamente do que a taxa com que eram criados. A energia liberada nesta aniquilação temporariamente diminuiu a taxa de resfriamento do universo, mas a temperatura continuou a cair, alcançando um bilhão de graus ao fim dos primeiros três minutos.

Essa nova temperatura permitiu que os prótons e nêutrons começassem a se juntar para formar núcleos complexos, começando com o núcleo de hidrogênio pesado (ou deutério), que consiste em um próton e um nêutron, e em seguida núcleos de hélio, composto por dois prótons e dois nêutrons. Ao fim dos primeiros três minutos, o conteúdo do universo era composto essencialmente por fótons, neutrinos e anti-neutrinos. Havia também a parcela remanescente dos elétrons sobreviventes à aniquilação com os pósitrons e uma parcela de núcleos que consistia em cerca de 73% de hidrogênio e 27% de hélio.

Esses foram os ingredientes que, centenas de milhares de anos mais tarde, formaram os primeiros átomos que acabaram se condensando para dar origem às estrelas e galáxias do Universo atual.

Nícolas Oliveira, colunista do Tecmundo, é licenciado em Física e mestre em Astrofísica. É professor e atualmente faz doutorado no Observatório Nacional, trabalhando com aglomerados de galáxias. Tem experiência com Ensino de Física e Astronomia e com pesquisa em Astrofísica Extragaláctica e Cosmologia. Atua como divulgador e comunicador científico, buscando a popularização e a democratização da ciência.

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